Arbitragem tributária: caminho para desjudicialização

O debate sobre a possibilidade de aplicar a arbitragem ao direito tributário no Brasil tem sido marcado por resistência histórica. A ideia de que o crédito tributário era indisponível e que apenas a jurisdição estatal poderia decidir sobre ele era a lógica dominante por décadas. No entanto, a atual realidade do sistema tributário, com o volume crescente de processos e a ineficiência temporal do Judiciário, exige uma reavaliação desse ponto de vista.



Com a entrada em vigor da Emenda Constitucional 132/2023, que traz mudanças significativas no regime de tributação sobre consumo, surge uma necessidade urgente de mecanismos mais ágeis e técnicos para resolver conflitos entre fisco e contribuinte. A arbitragem tributária se apresenta como solução, oferecendo um ambiente técnico e imparcial que pode coexistir com a jurisdição estatal, desde que regulado por lei.



O Projeto de Lei 2.486/2022, em tramitação no Senado e elaborado pela Comissão de Juristas presidida pela ministra Regina Helena Costa, pretende ser o marco normativo que introduz a arbitragem no contexto tributário. O texto prevê a regulamentação da arbitragem em duas fases: preventiva, antes da constituição do crédito, e repressiva, após a lavratura de auto de infração. Além disso, diferencia dois tipos de arbitragem – ordinária, para créditos de maior valor, e expedita, para valores menores – visando atender tanto grandes contribuintes quanto pequenos.



Uma das principais críticas à arbitragem tributária refere‑se à inafastabilidade da jurisdição e à indisponibilidade do crédito público. Essa interpretação, contudo, não encontra respaldo no entendimento do Supremo Tribunal Federal, que já reconheceu a legitimidade da arbitragem em litígios envolvendo a Administração Pública. A Lei 13.988/2020, que permite transações com remissão parcial da dívida, demonstra que o crédito público não é absoluto e que a composição de dívidas pode ocorrer dentro dos parâmetros legais.



A arbitragem, portanto, não implica renúncia aos direitos creditórios do Estado, mas estabelece um ambiente e um método para resolver controvérsias sobre a exigibilidade do tributo. O legislador, dentro dos limites constitucionais, pode definir o grau de disponibilidade do crédito, ajustando os critérios para sua constituição, modificação ou extinção de forma a atender à economicidade e à eficiência administrativa.



Para garantir a credibilidade e a segurança jurídica da arbitragem, o PL 2.486/2022 prevê critérios objetivos de seleção e credenciamento das câmaras arbitrais, além de estabelecer que a arbitragem não pode ser realizada de forma ad hoc, evitando a falta de estrutura administrativa e a possível fragilidade do processo.



O projeto também prevê que a arbitragem, quando pendente, suspenda a exigibilidade do crédito tributário e interrompa a prescrição, em consonância com o Projeto de Lei Complementar 124/2022, que altera dispositivos do Código Tributário Nacional. Essa articulação entre projetos é essencial para conferir efeitos jurídicos plenos à arbitragem no âmbito tributário.



O sucesso da adoção da arbitragem tributária dependerá da adesão dos entes federativos – estados e municípios – ao modelo federal, respeitando a autonomia e os princípios constitucionais. A implementação de modelos próprios, inspirados na legislação federal, pode ser uma estratégia eficaz para garantir a uniformidade e a confiança no novo regime.



Em síntese, abandonar a visão de que o crédito tributário é indisponível e reconhecer a arbitragem como instrumento constitucionalmente legítimo, juridicamente seguro e institucionalmente oportuno representa um passo importante para modernizar a solução de conflitos tributários. A efetividade desse instrumento pode reduzir a carga sobre o Judiciário, acelerar a resolução de litígios e oferecer maior segurança jurídica a todos os envolvidos.



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Arbitragem tributária: caminho para desjudicialização
Rannyelly Alencar Paiva 21 de dezembro de 2025
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