O Supremo Tribunal Federal, nesta sexta-feira 12 de setembro, confirmou a aplicação da taxa Selic como índice de correção monetária e juros moratórios em condenações civis. A decisão encerra um debate que durou anos entre tribunais e que envolvia a interpretação do artigo 406 do Código Civil e a compatibilidade com normas tributárias. A 2ª Turma do STF, por maioria, reconheceu que não há impedimento legal para que a Selic seja utilizada na atualização de dívidas civis, encerrando, assim, um impasse que havia sido objeto de discussão no Superior Tribunal de Justiça.
Historicamente, o artigo 406 do Código Civil, na sua redação antiga, estabelecia que, na falta de convenção de juros, a taxa a ser aplicada seria a que estivesse em vigor para pagamento de impostos devidos à Fazenda Nacional. A nova redação, fruto da Lei 14.905/2024, menciona expressamente a Selic como índice de correção. Antes da reforma, a alternativa era a aplicação de juros de 1% ao mês, conforme o parágrafo 1º do artigo 161 do Código Tributário Nacional, e a correção monetária segundo o índice praticado em cada tribunal.
O caso que serviu de base para a decisão tem origem em uma ação de indenização decorrente de acidente de trânsito ocorrido em 2013. A autora, representada pelo advogado Leonardo Amarante, buscava receber R$ 20 mil. Desde então, a discussão girava em torno da atualização desse valor. A Corte Especial do STJ, em decisão tomada no ano anterior, por 6 a 5, já havia reconhecido a Selic como índice correto para a correção. A Lei 14.905/2024, que entrou em vigor logo depois, acabou de forma definitiva qualquer dúvida sobre a matéria.
Segundo a regra vigente, quando a taxa de juros moratórios não está prevista no contrato, a correção de dívidas civis deve ser feita pela aplicação da Selic menos o IPCA, ou outro índice previsto em lei específica. O recurso extraordinário apresentado pelo advogado Amarante alegou que a aplicação da Selic violaria a segurança jurídica, a isonomia e a reparação integral do dano. Argumentou que a taxa, que oscila de acordo com orientações do Banco Central e do governo federal, pode depreciar os valores corrigidos, dependendo da metodologia empregada.
O relator do caso, ministro André Mendonça, votou a favor da utilização da Selic. Ele foi acompanhado por Gilmar Mendes, Dias Toffoli e Luiz Edson Fachin. Mendonça ressaltou que o STJ, ao decidir sobre o tema, interpretou os Códigos Civis de 1916 e de 2002, o Código de Processo Civil e o CTN. Para divergir da interpretação do STJ, seria necessário reexaminar a legislação, o que não é permitido em julgamentos de recursos extraordinários. Mesmo que fosse possível, o próprio Supremo já havia autorizado o uso da Selic em correções de dívidas cíveis, como demonstrado na ADC 58, que tratou de débitos trabalhistas.
O voto do ministro Mendonça, que pode ser lido no portal do STF, reforça que a jurisprudência do tribunal reconheceu a validade da Selic como índice de correção monetária e juros moratórios, bem como sua incidência em condenações civis em geral. O entendimento consolida a prática de diversas cortes que já utilizavam a Selic em seus cálculos de atualização de valores devidos, eliminando a necessidade de aplicação de juros de 1% ao mês ou de índices de correção monetária específicos de cada tribunal.
Para as partes envolvidas em processos de indenização e outros litígios civis, a decisão traz estabilidade e previsibilidade. A aplicação da Selic evita a necessidade de ajustes contratuais ou de decisões judiciais que possam alterar o índice de correção, mantendo a uniformidade entre decisões judiciais e a política monetária do país. Além disso, a regra agora permite que a correção monetária seja feita de maneira mais transparente, já que a Selic é divulgada mensalmente pelo Banco Central e seu comportamento está bem documentado.
É importante destacar que a decisão do STF não impede a aplicação de outras taxas em casos específicos em que a lei prevê outro índice. Entretanto, para a maioria das situações em que não há cláusula contrária, a Selic será o padrão de correção, alinhando o direito civil à política monetária vigente. Isso pode reduzir a litigiosidade em torno de índices de correção e facilitar a conciliação entre credores e devedores.
Para os advogados, a decisão implica a necessidade de atualizar a orientação que dão aos clientes sobre a correção de dívidas. Os escritórios devem informar que a Selic será o índice padrão, mas que, em casos em que a lei prevê outra taxa, essa deverá ser observada. Além disso, a decisão pode impactar a estratégia de cobrança de dívidas, já que a taxa Selic tende a ser mais baixa em períodos de estabilidade econômica, reduzindo o montante atualizado em comparação com a taxa de 1% ao mês.
Em termos de segurança jurídica, a decisão fortalece a previsibilidade no campo do direito civil. A aplicação de um índice de correção que já é reconhecido em diversas áreas do direito, como o tributário e o trabalhista, cria uma base comum para cálculos judiciais. Isso facilita o entendimento por parte dos jurisdicionados e reduz a margem de erro na aplicação de juros e correções.
Para o futuro, a decisão pode influenciar a elaboração de contratos civis. Ao incluir cláusula de correção monetária, as partes podem optar por usar a Selic como índice, garantindo que a atualização dos valores esteja em consonância com a política monetária oficial. Isso pode ser especialmente relevante em contratos de longo prazo, onde a variação da Selic pode ter impacto significativo no valor final.
Em síntese, a decisão do STF sobre a aplicação da Selic como índice de correção monetária e juros moratórios em condenações civis representa um marco na consolidação de uma prática já em uso em vários ramos do direito. A uniformização traz segurança jurídica, previsibilidade e alinhamento com a política monetária do país, beneficiando credores, devedores e o sistema judicial como um todo.
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