Estelionato sentimental gera direito a indenização de danos morais e materiais, decide Quarta Turma



Artigo sobre Estelionato Sentimental e Indenização


Nos últimos anos, a evolução do direito em resposta a novas formas de criminalidade tem se mostrado fundamental para a proteção dos indivíduos em diversas esferas, especialmente no que diz respeito a crimes que envolvem relacionamentos afetivos e manipulação emocional. Um exemplo notável desse progresso é o reconhecimento do estelionato sentimental como ato ilícito, passível de indenização por danos morais e materiais. A Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu, de forma unânime, que a simulação de um relacionamento amoroso com o intuito de obter vantagens financeiras configura um ilícito civil que exige reparação. Essa importante decisão jurisprudencial é um marco na luta contra fraudes emocionais e uma proteção necessária para aqueles que se tornam vulneráveis em situações de afecto.



O caso em questão envolveu um homem que induziu sua ex-companheira a contrair empréstimos que beneficiaram exclusivamente o réu. A vítima, uma viúva 12 anos mais velha, declarou ter repassado cerca de R$ 40 mil ao homem durante o relacionamento, crente de que estava ajudando um parceiro em dificuldades financeiras. A relação, marcada pela manipulação e engano, se deteriorou rapidamente após a mulher se recusar a fornecer mais dinheiro, resultando em um rompimento que culminou na busca por justiça através do judiciário.



Ao surgir o conflito, a mulher fez uma representação judicial solicitando reparação pelos danos materiais e morais que sofreu. O juízo de primeira instância não hesitou em reconhecer a ilicitude do ato e condenou o réu a pagar R$ 40 mil em danos materiais e R$ 15 mil em danos morais. A decisão foi mantida pelo Tribunal de Justiça de São Paulo, demonstrando a seriedade da situação e a necessidade de proteger a vítima de abusos emocionais e financeiros.



O réu, em seu recurso especial ao STJ, argumentou que não havia ato ilícito e que os danos não eram indenizáveis, alegando violação dos artigos 186 e 927 do Código Civil. Esses artigos tratam da responsabilidade civil e da obrigação de reparar danos causados a outrem, seja por ato ilícito ou por ato que, ainda que lícito, resulte em prejuízo a terceiro. Diante do exposto, a relatora do recurso especial, ministra Isabel Gallotti, fez uma análise criteriosa do caso, destacando aspectos fundamentais que configuram o estelionato.



A ministra deixou claro que, para que se caracterize o estelionato, é imprescindível a presença de três elementos: a obtenção de vantagem ilícita em prejuízo de outrem, o uso de meio fraudulento e a indução ou manutenção da vítima em erro. No caso em análise, todos esses elementos estavam presentes. O homem havia utilizado sua posição emocional e suas habilidades manipulativas para levar a mulher a acreditar que havia um vínculo amoroso genuíno, quando, na realidade, seu único objetivo era a obtenção de vantagens financeiras.



Além disso, a relatora enfatizou que o réu tinha pleno conhecimento da vulnerabilidade emocional da mulher, explorando-a de forma predatória para simular um relacionamento amoroso. Essa manipulação incluiu a criação de uma narrativa de dificuldades financeiras e o uso de pressão emocional para conseguir obter valores que não tinham qualquer relação com obrigações normais típicas de um relacionamento amoroso saudável.



Um aspecto relevante abordado pela ministra é que, mesmo que os pagamentos realizados pela mulher tenham sido feitos de forma voluntária, sem uma coerção física direta, isso não anula o caráter ilícito da conduta do réu. O fundamento do estelionato está precisamente na ilusão e engano criados pelo agente, levando a vítima a agir de maneira desinformada e iludida sobre a veracidade do vínculo que acreditava ter estabelecido. Esse ponto é crucial, pois sublinha que a responsabilidade do autor do crime não pode ser mitigada sob a alegação de que a vítima teria agido de forma voluntária.



Em sua conclusão, a ministra Isabel Gallotti reafirmou a necessidade de compensar adequadamente a vítima pela simulação de relacionamento e pelas ações enganosas do réu, o que dá ensejo a um direito de indenização por danos materiais, que abrangem não apenas as quantias transferidas durante a relação, mas também outros gastos que possam ter emergido devido a essa relação distorcida. Os danos morais, por outro lado, estão relacionados ao sofrimento emocional experienciado pela mulher ao perceber que foi manipulada e enganada, o que agrava a situação e justifica a fixação de uma indenização que possa, de alguma forma, reparar a dor causada.



Além de trazer uma solução justa ao caso concreto, essa decisão do STJ abre um importante precedente para futuras situações semelhantes. O reconhecimento do estelionato sentimental como uma forma de ilícito civil reafirma a proteção que deve ser conferida aos indivíduos em suas relações pessoais, especialmente aqueles que, devido a experiências passadas e vulnerabilidades emocionais, se tornam alvos de manipulações e fraudes. O judiciário, ao condenar tais práticas, faz uma declaração de que o amor e as relações afetivas não devem ser utilizadas como instrumentos de exploração e que a vítima de danos emocionais e financeiros pode e deve buscar reparação quando for lesada.



Importante destacar que a proteção dos direitos da personalidade, incluindo direitos ao amor, à dignidade e à integridade psíquica, são fundamentais em uma sociedade civilizada. Por isso, o papel do advogado nesse contexto é essencial, sendo seu dever não apenas representar os interesses de seus clientes, mas também contribuir para a formação de uma sociedade mais justa e igualitária, onde valores como respeito e dignidade sejam verdadeiramente respeitados em todos os âmbitos, incluindo aquele que é mais íntimo e emocional.



À medida que as relações interpessoais evoluem e novos desafios emergem, é necessário que as instituições, em especial o sistema judiciário, se adaptem e respondam com o rigor que a proteção da dignidade humana exige. Nesse sentido, o estelionato sentimental representa uma ferida em áreas sensíveis da vida pessoal de alguém, ferida essa que pode deixar marcas duradouras, não apenas financeiras, mas também emocionais.



A educação e a conscientização acerca desse tipo de crime são fundamentais para prevenir que mais pessoas se tornem vítimas de fraudes emocionais. Campanhas de informação, programas de apoio psicológico e a promoção de um diálogo aberto sobre relacionamentos saudáveis podem ajudar a reduzir a incidência de tais delitos, promovendo uma cultura onde o respeito mútuo e a transparência sejam imperativos nas interações humanas.



Por fim, reafirmamos o compromisso do escritório Calaça & Paiva Advogados Associados em estar na vanguarda da defesa dos direitos dos cidadãos, oferecendo não apenas representação legal, mas também orientação e apoio para que as vítimas de estelionato sentimental e outras formas de abuso emocional possam encontrar justiça e recuperar o que lhes foi tirado. Cada caso é uma oportunidade de mudança, e estamos dispostos a lutar por um mundo onde o amor seja verdadeiramente um vínculo de respeito e não uma armadilha para a exploração.



Para mais detalhes sobre o julgamento e os fundamentos da decisão do STJ, recomendamos a leitura do acórdão no REsp 2.208.310, que elucida ainda mais as nuances do estelionato sentimental e as obrigações decorrentes desse tipo de ato ilícito.



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Rannyelly Alencar Paiva July 14, 2025
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