Como advogado do escritório Calaça & Paiva Advogados Associados, apresento um relato completo e resumido da decisão que tem repercussão significativa no cenário de direitos dos beneficiários do Auxílio Emergencial e na relação com instituições financeiras.
O caso em questão envolve uma ex‑estudante de medicina veterinária que, após concluir o curso em 2020, se viu obrigada a regularizar uma dívida junto ao Fundo de Financiamento ao Estudante do Ensino Superior (Fies). Em 2021, durante a pandemia, a mãe da autora passou a receber o Auxílio Emergencial, o que, por lei, incluiu a jovem no grupo familiar do beneficiário.
Conforme o entendimento do juiz Flavio Barbosa Kamache, da 24ª Vara Federal do Rio de Janeiro, o artigo 341 do Código de Processo Civil autoriza a presunção de veracidade das alegações quando há inércia de uma das partes. No presente caso, a Caixa Econômica Federal se recusou a apresentar documentos que comprovassem que a autora não havia se beneficiado do auxílio. Em contraste, a autora juntou comprovantes que demonstram sua inclusão no grupo familiar da mãe e a efetiva percepção do benefício.
O banco alegou que o desconto de 92% aplicado ao saldo devedor era “inadequado” porque a autora não seria beneficiária direta. A instituição então “readequou” o contrato, reduzindo o desconto para 77%. A autora não pagou a nova cobrança, resultando em negativação do nome junto aos órgãos de proteção ao crédito.
O magistrado, ao analisar a falta de resposta da Caixa e a documentação apresentada pela autora, considerou as alegações da jovem como verdadeiras. Ele ressaltou que a legislação não impede que a autora continue a integrar o grupo familiar da mãe, mesmo após completar 25 anos. Assim, o reenquadramento foi declarado indevido.
Além da anulação da dívida, o juiz determinou que a Caixa pague indenização por dano moral, fixando o valor em R$ 4.000,00. A decisão fundamenta que a inclusão indevida no cadastro de inadimplentes viola direitos de personalidade da autora, gerando dano moral “in re ipsa”, isto é, sem necessidade de comprovação adicional.
O advogado Ronaldo Ferreira, que atuou em defesa da autora, destacou que a decisão reafirma o princípio da boa-fé objetiva e a necessidade de as instituições financeiras observar a legislação que protege os beneficiários do Auxílio Emergencial. A decisão serve como precedente para casos semelhantes, onde a falta de comprovação por parte do credor pode resultar em presunção de veracidade das alegações do devedor.
Em síntese, a decisão reforça a importância da responsabilidade documental das instituições financeiras e protege os direitos de quem, mesmo indiretamente, se beneficia de políticas públicas de apoio social. A autora recebeu não apenas a anulação da dívida, mas também a reparação pelos danos causados à sua reputação e aos seus direitos de personalidade.
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